sexta-feira, 13 de março de 2009

Minha Crônica no Tribuna Lagoana (Nova Era)

Uma página, uma Nova Era



Enquanto espirrava, folheava um dos livros de registro, aqueles enormes livros, a bíblia dos sábios e admiradores únicos e escassos da biblioteca. A maior parte das linhas, retas, encontrava-se vazia, límpida, como um céu na primeira manhã de verão. Os poucos traços azuis borravam os papéis puídos de nomes de seres já do além. Não conseguia decifrar de que família pertencia aquele assíduo leitor. Cuidadosamente, passava página por página, trabalho em vão, ofício de um homem a procura do tesouro. Na sala ao lado a bibliotecária já me olhava com pena e intriga, “O que ele tanto procura no diário de aluguel de livros?”, pensava ela com seus botões mal cosidos. E abraçado, tristemente, lendo alguns nomes, naquele caderno de brochura, que percebi as migalhas da cultura e o mofo do descaso pelos livros, naquela linda biblioteca de Nova Era.

Há de se saber que no Brasil o equivalente a 77 milhões de pessoas afirmam não gostar de ler, segundo a pesquisa realizada, no ano passado, pelo Instituto Pró-Livro. As justificativas principais para os fantasmas da leitura foram: não têm paciência para ler, leem muito devagar, não compreendem o que leem e por aí segue o descabimento. Esta é a realidade brasileira, a qual deixa as prateleiras das bibliotecas literalmente organizadas, petrificadas, intactas, somente destinadas aos paleontólogos literários. Não faço, aqui, votos para a aquisição de livros em livrarias, pois sei dos altos preços. No entanto, existe, em cada município, aquela mina do rei Salomão, aberta ao público, cheia de pérolas da história. Mesmo assim, lá está o guarda-livros largado a festa das traças.

Abro um novo livro. Atiro um olhar de indignação, principalmente por Nova Era, a esta cidade contando mais de três séculos, sem um sebo sequer, sem um reflexo de cultura-histórica, que tanto carrega; ou mesmo a curiosidade dos seus habitantes pela leitura, por aquele local. Tenho conhecimento da falta de estrutura e de acervo para a casa pública do saber, mas é evidente a contramão que seguimos, pois o déficit de leitura, desde os estudantes, é deplorável. A população é incapaz de digerir um jornal diário, uma revista, quem dirá de uma bula de remédio! Ah! Claro, fofocas e tititis de novelas e vida dos artistas, sangue e futebol, isso é a chama que clareia a penumbra dos tontos olhos. E alguns dirão: “Que me importa isso?”. Com certeza, também, meia dúzia de políticos, eleitos por você, devem estar agradecendo a sua falta de informação. Logo, os “iletrados” têm menos questionamentos a se fazer e nunca irão ler as absurdas propostas e projetos de leis. Depois fica você, na porta de casa, reclamando disso e daquilo e fala que político só deseja roubar.

Leio outro capítulo. Viro a página. Mais um problema.

As leituras obrigatórias dos colégios, supostamente impostas pelos professores, (sou prova disso) acabam sendo ineficientes e de pouco entendimento para os alunos. Machado de Assis? Que chato! Cochilos na primeira página. O próprio ensino pedagógico, às vezes, inofensivo, falha ao tentar enfiar os clássicos (para os estudantes óleo de fígado de bacalhau) goela abaixo. O contexto social de cada pessoa, também, deixa em frangalhos qualquer professor, porém não é o caso para tanto descaso. Deve haver reciprocidade tanto pelo “leitor” quanto pelo professor. A didática não pode ser jurássica, bem como o aluno melodramático deve ser mais entusiástico.

Antes de fechar as páginas desta questão, quero dizer que pouco custa à curiosidade. Que o fuxico seja entre Bentinho, Escobar e Capitu. Procure adentrar as portas desse patrimônio da cidade, e, em seguida, riscar com os olhos as páginas de um livro. Um bom papo, uma boa história, surge, muitas vezes, nas frases de uma obra.

Assim, tranquilamente, depois do vácuo encontrado naquele objeto do guarda-livros, torno a apanhar a caneta, tiro a fina poeira enferrujada das linhas, e molho o papel com o meu nome nas páginas de uma Nova Era.



Vinícius Ferreira Magalhães

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