quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

QUADRILHA


João amava Ricardo, que de noite era a travesti galante Teresa Purpurina,
que amava o excêntrico Valdecir, o qual tomava chuva achando que era pílula,
que amava Madalena, cheia de joias e maquiagem mais caras do que as dele,
que amava Claudionor, jovem onanista dos banheiros de igrejas,
que amava Luziene, namoradeira de melancolias,
que não amava seu advogado.
João foi pra Cracolândia, Teresa foi para a parada LGBT,
Raimundo fichou numa empresa de calçados chineses,
Madalena se candidatou para prefeita em sua cidade natal,
Claudionor faz bicos nas praças vendendo nomes em grãos de arroz para os famintos,
Luziene está nos jornais como desaparecida desde 26 de fevereiro de 2014, tem atualmente 25 anos,
Valdecir é empresário, sonega impostos e acaba de se divorciar de Joaquim Coelho Menezes que não tinha nenhum imóvel nessa história.

(VFM)

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

CONTOTIDIANO


Ela ouvia naquela semana a mesma música que a fazia lembrar dele. Copinho de requeijão na mão com licor de jabuticaba. Dançava pela sala votiva e leve, sorrisinho fulgente. Os vizinhos passavam horrorizados, negaceando com a cabeça. A vitrolinha repetia insistentemente a Marcha Fúnebre.
(VFM)

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

QUEM É VOCÊ, PAPAI NOEL?!


(Inspirado em Ademar Paiva)

Quem é você, Papai Noel, que me deixa a espera todo ano e eu fico aqui sonhando boas novas, e o presente ignóbil da burguesia. Sua veste vermelha de um falso comunismo, enquanto milhões lá fora choram a presente-pobre-vida.
Quem se dá ao trabalho de organizar a festa às vezes mal lê a humanidade. Eu, na minha estupidez e ingenuidade, só lhe pedia a saudade. Gostaria de rever ao meu lado as pessoas que me tricotaram carinhos. Mas foi tudo uma invenção. O que está nos meus pés será agrado para esquecer toda minha chorosa conversa contigo? Quem é você, Papai Noel?! As pessoas falam tanto de ti e fazem tanta maldade. Não posso compreender isso.
Eu vejo a mesa farta, porém minha saudade não tem fome. É a detestável hipótese de engolir uma uva passa. O que passa comigo, Papai Noel. Se todo mundo soubesse a falta que ele e ela me fazem, quem sabe as pessoas teriam mais humildade. Ficaríamos imóveis, chorando, até que os sinos silenciassem. Vocês voltariam no seu veículo de felicidade e me abraçariam e diriam: “O mundo é um eternamente pouco”. Logo, abaixariam a cortina dos olhos e chorariam comigo.
O desamor jogou pedra na sua fantasia, Papai Noel! Eu fico a arrumar o presépio dos problemas. Você talvez não se recorde, pois são milhares de pessoas que pedem o meu inexplicável. Eu cresci tão rapidamente e deixei de ver e amar tanta coisa, tanta gente. Acho que só agora que tardei em perdi perdão por não ter aproveitado o colo e os versos amigos mais.
Estou escrevendo essa cartinha, Papai Noel, sem pretensões de ser retribuído, pois me considero um erro no sorriso dos meus familiares. Eu te esperei, mas você não veio. O presente seria essa saudade angulosa e ferina?! Quero que eles voltem, Papai Noel! Da minha varanda, eu, cansado, apreensivo, percebo-me repetitivo e solitário. Não quero essa saudade. Foi quando eles partiram que passou pela minha cabeça o quanto eu os admirava. Essa sessão de ausência e esquecimento eu não quero mais, Papai Noel! Eu grito os teus nomes, no entanto creio que eles devem estar ocupados lá no céu. Agora um lugar de encantos.
Não me recordo nem mais da última vez que sorrimos juntos. Essa ruína atrás de mim e o meu sentimento devastador vem em palpitações. Creio que não me queira ver desiludido e que um dia você vem me buscar, Papai Noel. Assim eu possa ser o presente de alguém, na presença de algum Natal. Baterei a porta forte e farei uma chaminé aos esquecidos. Talvez eu descobrisse quem é você, Papai Noel! E entenderia que Deus faria a mesma pergunta. No entanto, ao final, ele me responderia: “É Você, meu Filho!”. E eu seria toda essa saudade.
Mas quem é você, Papai Noel?
(VFM)